quarta-feira, 15 de novembro de 2017

Diálogo entre um Esu e um Preto Velho

Vamos ver um diálogo que nos demonstra que as Entidades são luz, são divinas, são caminhos, mas sentem uma tristeza em ver seus filhos, consulentes e protegidos tentando fazer deles escravos espirituais.


Em um certo dia na beleza das terras espirituais de Aruanda, cidade de luz onde encontramos nossas amadas Entidades, um Exú que acabara de retornar de um trabalho espiritual de incorporação em um médium trabalhador de uma casa umbandista, vai até um Preto Velho, que se encontrava sentado em seu toco de madeira, pitando calmamente seu cachimbo, soltando a fumaça no ar e observando toda a bela natureza da cidade espiritual. 
O Exú chega olhando firme para o velho negro, e assim se inicia o diálogo: 

 Exú: Sua benção meu velho. 

 Preto Velho: Que Pai Oxalá te abençoe meu fio. 

 Exú: Será que posso ficar um pouco com o senhor meu velho? 

 Preto Velho: Claro meu fio. Mas porque esse semblante tão entristecido? 

 Exú: Acabei de chegar de uma Gira em um Terreiro de Umbanda, no qual trabalhei com um médium muito honesto, que me deixa a vontade em me expressar, sem que ele tente interferir ou mistificar. 

Preto Velho: Mas isso não é para nos deixar feliz fio? 
Tantos médiuns que são tomados pela vaidade, arrogância, falta de humildade. Esse fio que vosmicê trabaia, sendo um exemplo na religião, e vosmicê chega tristonho? 

Exú: Sim meu velho, eu tenho muito carinho e respeito por esse médium caridoso, trabalhador da honestidade. Mas, essa tristeza que está apertando em meu peito meu pai, não é pelo meu amado aparelho. São pelas pessoas que foram ao terreiro, pessoas que se consultaram comigo, com meus irmãos e minhas irmãs. 

 Preto Velho: Sim meu fio, estou começando a entender essa sua tristeza. Mas vamos tirar ela de seu peito, encoste sua cabeça no ombro desse veio, deixe seu coração falar, deixe sua luz se acender, desabafe tudo aquilo que você trouxe lá da terra, dos sentimentos dos homens sem sentimentos. 

 O Exú encostando a cabeça no ombro do Preto Velho, como se pedisse um afago, fez uns segundos de silêncio e logo após se pôs a falar, num tom baixo, um tanto desanimado, cabisbaixo, parecendo tentar esconder algumas lágrimas que teimavam em cair de seus olhos. 

 Exú: Sabe meu pai, nessa gira de hoje tive muitos atendimentos. Homens que desejavam que seu semelhante perdesse a vida, para que assim pudesse se apropriar de cargo superior em local de trabalho de ambos. 
Mulheres que traziam ódio no coração por um suposto amor, que só ela entendia que existia, entre ela e um homem, que por seu livre arbítrio, achou por bem que deveria tomar outro caminho. Tantas maldades pedidas, tantos desamores, tantas angústias, tanto ódio espalhados em palavras, tantas cobranças, tantas aberturas dadas a obsessores, que invadiam os corações e mentes dessas pessoas, fazendo delas fantoches do espírito do mal. 

 Preto Velho: Sim meu fio. Entendo o que deseja dizer. 
Já vi muita dessas pessoas nas casas de Umbanda, e isso sempre nos traz essa tristeza que você tem em seu peito. 

Exú: Meu velho, tive que lutar muito no dia de hoje, para tentar salvar as almas dessas pessoas. A cada pedido para que seja feito o mal, novos obsessores chegavam. 
Meus irmãos que tomavam conta da tronqueira, lutavam firmemente e arduamente para que nossa gira não fosse dominada por Kiumbas e Zombeteiros. 
Minhas irmãs, Pombo Giras, tentavam se fazer entender, falando as pessoas de coração sombrio e cheio de ódio, que o amor não se amarra, se conquista. 
Eu via por todos os cantos da casa grandes obsessores trazidos pelos filhos que ali estavam simplesmente para pedir o mal e trazendo nas mãos marafo, charutos, materiais orgânicos, tentando comprar magias não existentes.
 E achando tudo isso a coisa mais natural do mundo. 

 Preto Velho: E alguns de vosmicês aceitaram essas trocas meu fio? 

 Exú: Não meu Pai. Estamos acima dessas vontades materiais e orgânicas. 
Mas infelizmente temos alguns médiuns mistificadores que usam nossos nomes para tal recebimento. Dizendo fazerem amarrações, trancamentos, maldades, fechamentos de caminhos, e muitas outras coisas sujas. 

 Preto Velho: E vosmicês alertaram o Babalorixá da casa, do acontecido? 

 Exú: Mas meu velho, era o próprio Babalorixá que se prestava a essas cobranças, usando o nome de um de nossos irmãos. 

 Preto Velho: Cada vez mais entendo sua tristeza meu fio. 
Mas diria a ti para não se deixar ser levado por esses medíocres da religião, pois meu fio, a Umbanda está muito acima disso, está muito além dessa falta de compreensão, muito acima dessa ganância, muito acima desses obsessores encarnados e desencarnados. 

 Exú: Sim meu pai. Eu creio nisso também. 

 Preto Velho: Creia sempre meu fio. Pois Deus espera de nós, Entidades, essa grandeza de fazer o bem, lutar contra o mal, ensinar os incompreensíveis a compreender, mostrar o caminhos de luz a quem teima em buscar escuridão. 

 Exú: Sabe meu pai, no meu caminho de volta para Aruanda, para não chegar aqui com tantas cargas negativas, tantos obsessores trancados, tantos sentimentos humanos ruins, fui até aos irmãos da Calunga Pequena, para que me auxiliassem a me livrar de tantos pesos deixados pelos consulentes e seus pedidos incoerentes. 
Vi muitas moradas de corpos inertes, corpos esses que as almas estavam presas nas profundezas clamando por ajuda. Um desses corpos me chamou a atenção meu velho. 
Era de um antigo consulente que hora ou outra vinha até mim pedir para que seus caminhos abrissem, e para isso ele deveria então passar por cima de um semelhante. 
Esse homem, certa vez me disse que ali onde nos encontrávamos não teria o "trabalho forte" que ele tanto buscava. 
Que ali só se falava em Deus, que ali não abria caminhos que ele desejava abrir, do modo que ele pretendia. Escutei calmamente aquelas palavras, olhei em seus olhos e disse, que o caminho dele era ele mesmo que fazia, seu livre arbítrio era respeitado, assim como ele deveria respeitar o livre arbítrio de todos. 

 Preto Velho: Fez muito bem meu fio. 

 Exú: Lhe disse também, que ele poderia partir, que levasse Deus no coração, e refletisse sobre aqueles pedidos. 
E certamente um dia nos veríamos de novo, e dependendo de seu modo de agir e pensar dentro da religião, nosso encontro seria ou em um caminho de luz, ou em um caminho da escuridão, onde eu certamente teria que resgatá-lo.

Preto Velho: Belas palavras meu fio. 
Vosmicê sabe muito bem como é o caminho dessa escuridão, esteve lá milhares de vezes resgatando almas perdidas, buscando seres sem humildade, sem amor, entregues ao ódio, que muito se arrependeram após conhecer a verdadeira desgraça da maldade criada em seus próprios corações. 

Exú: Isso mesmo meu pai. Um lugar dominado pelo mal, por obsessores, kiumbas, eguns e Zombeteiros, tomados pela enorme vontade de sugar todas as energias, todas as formas orgânicas, todos os sentimentos de ódio que os seres humanos possam espalhar uns para os outros, fazendo assim que esses espíritos do mal possam ser fortalecidos dia após dia. 

 Preto Velho: Sim meu fio. Muito triste que os encarnados não compreendam isso. 
Esse fortalecimento do mal. 
Fortalecimento esse feito pela ganância, por esses pedidos de prejudicação a semelhantes, entregas de materiais orgânicos, como carne, sangue, e ainda dizendo que são para os Exús. 
Muito triste isso meu fio. 

 Exú: Sim meu velho, muito triste mesmo. 

 Preto Velho: Mas fio amado, continue me falando desse consulente. O que aconteceu? Você o encontrou novamente? 

 Exú: Sim meu velho. 
Ao ver aquele corpo inerte na Calunga Pequena, e ao reconhecê-lo, fiquei imaginando onde estaria o seu espírito. 
E foi ai que decidi ir até abaixo da linha da luz divina para tentar encontrá-lo. Preto Velho: E o encontrou meu fio? 

 Exú: Sim meu velho. 
Ele estava nas profundezas, quase sem energia nenhuma, tomado por obsessores de todos os lados, segurando em uma das mãos uma imagem de gesso, que ele acreditava ser minha. 
Uma imagem de um homem de pés de bode, chifres e cauda do demônio. 
Em outra das mãos ele segurava firmemente um grande pedaço de carne sangrenta, meio apodrecida já, juntamente com uma garrafa de bebida alcoólica e alguns charutos. 
Dizia que era sua oferenda para Exú, e que assim que conseguisse fazer essa entrega, todos seus desejos mais obscuros iriam se realizar. 

 Preto Velho: Pobre alma. 
Não entendeu ainda que só estava energizando os obsessores, e assim deixando seu espírito sem chance nenhuma de sair dali. Exú: Isso mesmo meu pai. 
Foi ai que eu cheguei perto dele, chamei-lhe a sua atenção para mim, ergui minha mão em sua direção e lhe disse, "Venha comigo meu filho. 
Deixe essas coisas nesse chão imundo. 
Você e nem eu precisamos disso." Ele me olhou firmemente, abraçando junto ao peito todas aquelas coisas, e disse: "Quem é você? O que quer de mim?" Eu respondi tentando ser o mais sereno e convincente possível: "Sou o Exú que você um dia foi procurar. 
O Exú que você não aceitou como protetor. 
O Exú que lhe disse que um dia íamos nos encontrar novamente. 
O Exú no qual você deu as costas e partiu. 
O Exú que você afirma que precisa dessas coisas materiais e orgânicas como oferendas. 
O Exú que está aqui para tentar lhe mostrar que seu livre arbítrio ainda tem um poder para te salvar da escuridão eterna e dos obsessores que tomam toda sua energia para que não tenhas forças para vencer. 
O Exú que está lhe dando a mão para sua evolução verdadeira. Deseja vir comigo? Preto Velho: E ele aceitou meu fio? 

 Exú: Infelizmente não meu velho. Ele me olhou de modo desconfiado, de cima a baixo, e disse: "Você não é um Exú. 
Onde está seus pés de bode, seus chifres e cauda. 
Onde está seus olhos flamejantes, seu odor de enxofre? Você deseja me enganar para levar minhas oferendas, e assim eu nunca vou conseguir fazer com que meus inimigos caiam para que eu consiga o lugar deles, eu nunca vou conseguir fazer os males da doença seja espalhada a quem um dia me ignorou, eu nunca vou conseguir aquele amor que deveria ser meu. 
Preciso amarrar aquela mulher. 
E você desejando tudo que tenho para comprar a magia dos Exús de verdade." Saia daqui, afaste-se de mim." 

 Preto Velho: Sim meu fio, ele ainda não tinha aprendido a usar o livre arbítrio para fazer o bem. 

 Exú: Não meu velho. Ele só via o próprio ódio que estava em seu coração. 
Infelizmente não pude fazer nada, além de insistir mais um pouco, tentar mostrar que eu era um Exú, e que somos Entidades de Luz, Entidades enviadas por Deus, e não apenas escravos das oferendas, que para nós é totalmente sem importância. Tentei mostrar que minha imagem humanizada, que minha voz serena, que minha face tranquila era exatamente a de um Exú, uma Entidade evoluída que tenta auxiliar todos os filhos que ainda se prendem aos erros impostos por alguns médiuns mistificadores ou interesseiros. 
E deixei bem claro que só poderia resgatá-lo pela menção de sua vontade, pois respeitaria seu livre arbítrio eternamente. 

 Preto Velho: E isso deixou vosmicê bastante tristonho não é meu fio? 

 Exú: Sim meu Pai. Não conseguir resgatar uma alma da obsessão, dos espíritos caídos, das trevas eternas, é de maltratar muito os sentimentos de protetores que nós, Exús e Pombo Giras temos. 
Mas ainda ficamos mais tristes quando são colocados nossos nomes como autores das crueldades, das más intenções, das amarrações, e de tantas coisas ruins, criadas pelos encarnados, feitos pelos Eguns, pelos Zombeteiros, pelos Kiumbas e depois cobrados a quem fez esses pedidos por dezenas e dezenas de obsessores, que vão sugar todas as energias desses encarnados até eles entregarem seus espíritos as trevas eternas. 
E depois nós, Exús e Pombo Giras, temos ainda a missão de tentar resgatar essas almas, dentro do livre arbítrio delas, às vezes não conseguimos, e muitas vezes conseguimos. 
E temos que ouvir alguns líderes de algumas religiões nos taxando de demônios, senhores das trevas, vagabundos, prostitutas e amaldiçoados. 
Ah meu velho, como é difícil esse trabalho. 

 Preto Velho: Sim meu fio. Mas vosmicê acredita se fosse fácil seria uma missão divina? 
Será fio meu, que se ocês, Exús e Pombo Giras, não tivessem essa missão tão árdua, vosmicês estariam nesse grau tão maravilhoso de evolução? 
Será que ter essa luta diária contra o mal, sem se deixar ser levado por oferendas sangrentas, por marafo entregue na encruza, por pito que faz uma fumaceira que esconde as más intenções, por ebós banhados por dendê, não faz dos amados Exús e Pombo Giras Entidades supremas, acima do grau de evolução de muitos seres? Será meu fio que quando um encarnado vem com a arrogância pedindo que faças uma amarração amorosa ou espiritual a um semelhante, e ocês com toda a humildade, mostram que o amor não pode ser amarrado, que o espírito é livre até que ele seja entregue aos obsessores através das maldades feitas pelo próprio encarnado. 
Mesmo que esse encarnado menosprezem seus trabalhos, chamando de "trabalho fraco", "trabalho sem força". 
Mesmo assim, ocês continuam tentando demonstrar que o bem não pode ser trocado pelo mal, que a luz não pode ser trocado pela escuridão, que o amor não pode ser trocado pela amarração. 
E se mesmo assim esse encarnado lhe der as costas, ocês o acompanham e o protege, mesmo sendo vistos ou como Exús fracos, ou como seres do demônio, mas sempre ali levando a luz. 

 Exú: Sim meu velho, é assim nosso trabalho. É assim que agimos. É assim que somos. 

 Preto Velho: Sabe meu fio, eu enquanto encarnado, nas fazendas de café, no cativeiro das senzalas sujas e frias, acorrentado nas correntes da ignorância do homem branco, sendo açoitado nos troncos da morte, já tive a mesma tristeza que ocês, exús e Pombo Giras trazem no coração. 
Então eu elevava minha fé a Zambi, rezava uma oração, pedia a nosso Deus poderoso para perdoar aqueles feitores que nos castigavam cruelmente, aqueles coronéis sedentos da ganância que nos vendiam como animais, aqueles homens e mulheres de peles branca como a nuvem que nos açoitavam, nos humilhavam, nos matavam friamente, apenas para demonstrar poder, apenas porque éramos negros na pele, esquecendo que tínhamos um coração que batia e chorava igualmente a todos, que tínhamos o sangue vermelho correndo nas veias como todos os seres de Deus, que amávamos, sentíamos dor, fome, sede, e tudo mais como os brancos. 
Mas mesmo assim éramos vistos como fracos, diferentes, escória, feiticeiros, endemoninhados. 
Então meu fio, talvez seja melhor fazermos uma prece para essas almas perdidas, para esses mistificadores que tentam se passar por ocês, para esses falsos líderes religiosos que necessitam de criar um inimigo que venha das trevas para induzir aos pobres fiéis sem conhecimento, e assim tirar todo seu ouro e prata, para todos que por ignorância imagina que a linha "docês" traz o mal, faz feitiçarias, amarra almas e sentimentos, tudo isso trocado pelo sangue, carne, velas, marafo, ebó, padê, como escravos das trevas. 
A prece acalma, traz luz a esses seres, afasta obsessores, encaminha almas, traz alegria. 
Vamos fazer essa prece meu fio? 

 Exú: Meu velho, o senhor tem uma sabedoria grandiosa. suas palavras já acalmaram meu coração. Vamos meu velho, vamos fazer nossa prece. 

 Preto Velho: Antes meu fio, dá cá um abraço nesse veio, que já está com lágrimas no zoio. 

 Preto Velho/Exú: Deus nosso Pai, que sois todo poder e bondade... ... Que assim seja!

domingo, 20 de agosto de 2017

Esu faz o primeiro Ogã

Um itan diz que o primeiro Alagbe foi Esú.
Ele tocava e cantava para os outros Orisás poderem dançar, durante as suas reuniões. Entretanto, o toque de Esu era bem alto e estridente, impossibilitando os outros Orisás de conversarem. Um dia, eles se irritaram com Esú e o mandaram parar de tocar.
Algum tempo depois começaram a sentir falta dos ritmos de Esú para dançar. As reuniões estavam sem graça e desanimada. A festa de Esú estava fazendo muita falta. Foram então a procura de Esú para que ele voltasse a tocar seus ritmos maravilhosos. Entretanto, Esú sendo muito orgulhoso recusou-se, mas, compadecido, disse que ensinaria os ritmos e toques ao primeiro homem que encontrasse pelo seu caminho.
O primeiro homem que Esú encontrou chamava-se Ogã, e como prometido Esú ensinou todos os ritmos dos demais Orisás a ele.

segunda-feira, 19 de junho de 2017

Assim quero ser!!!

Quando envelhecer, quero ser quem eu sou: Mulher de Religião...
Povo de Santo
Ser e me felicitar por sê-lo
Sair às ruas com minhas vestes, cantarolar as cantigas dos orisás, nosso amor original....
Pensar nas Coisas de Santo, lembrar das alegrias que os Osixás me deram.
Quando envelhecer, quero ser nostálgica. Não para minha auto-satisfação,mas, para não me esquecer de quem eu sou. Sou Omoobirin de Yemonja, filha de Sapponna, serva e amante dos Orisás.
Se eu envelhecer sem isso, não sobra nada de mim.
Eu sou do candomblé, pertenço a ele e ele me faz inteira.
Quero envelhecer como aquelas velhas senhoras que em suas vestes mostram a serenidade de ser Povo de Santo....
Assim quero ser....

sábado, 14 de janeiro de 2017

Maria Padilha




MARIA PADILHA - A CORTESÃ QUE SE TORNOU RAINHA

Admirada e prestigiada na Umbanda, Quimbanda e Candomblé, Maria Padilha é sem dúvida a Pomba Gira mais conhecida da religião afro-brasileira. E sua fama se expande para além das fronteiras brasileiras.
Muitas histórias norteiam a sua origem, é conhecida como a Esu-Mulher, o similar feminino de Esu. Como toda Entidade dessa categoria, acredita-se que ela trabalha em sintonia com as energias dos Orisás para ajudar encarnados e desencarnados, a amenizar o sofrimento do seu carma alcançando assim a evolução espiritual.
Maria Padilha assim como muitas outras Pombo Giras é chefe de falange, coordena milhares de espíritos que assim como ela tiveram em suas ultimas vidas momentos de sofrimento e angústia por um amor, recorrendo a maioria delas à magia para alcançarem seus objetivos. As Marias Padilhas são uma legião de muita força mágica e espiritual, aceitando diversos trabalhos de magia e demanda. Possuem muitos aliados espirituais e nunca trabalham sozinhas, sempre estão acompanhadas por outras falanges de Pombo Giras e Esus. As linhas de atuação dessas falanges são as mais diversas, logo, é comum encontrar Entidades com nomes:

* Maria Padilha da Estrada,
* Maria Padilha da Encruzilhada,
* Maria Padilha das 7 Encruzilhadas,
* Maria Padilha do Cabaré,
* Maria Padilha das Portas do Cabaré,
* Maria Padilha da Figueira,
* Maria Padilha do Cruzeiro do Cemitério/ da Calunga/das Almas,
* Maria Padilha do Inferno e etc.

Essas Entidades trabalham com uma energia específica, com um objetivo próprio e peculiar. Cada MARIA PADILHA citada acima é composta de milhares de MARIAS, cada qual com sua história verdadeira ou alegórica, mas com certeza todas vinculadas à líder. Principalmente por ligação cármica.
A postura, a maneira de falar, dançar, vestir tem mais a ver com a conduta dos médiuns do que com as personalidades individuais das Pombas Giras.
É uma Entidade de personalidade amigável, simpática, sensual, comunicativa e reservada. Bebe Champanhe, Licor de Aniz, Martini e outras bebidas doces. Fuma cigarros e cigarrilhas, gosta de joias e acessórios dourados e brilhantes, gosta de trajes de luxo nas cores negro, vermelho, dourado e dependendo da linha de atuação o branco, recebe suas oferendas nos lugares indicados por seus médiuns e por elas quando incorporadas.

Pontos Cantados:

Esú Maria Padilha,
Trabalha na Encruzilhada,
Esú Maria Padilha,
Trabalha na Encruzilhada,
Toma Conta,
Presta conta,
ao romper,
da madrugada,
Toma conta,
Presta conta,
ao romper,
da madrugada,
Pomba-gira, minha comadre,
Me proteja noite e dia,
E é por isso,
que eu confio,
em sua feitiçaria,
Pomba Gira, minha comadre,
Me proteja noite e dia,
E é por isso que eu confio,
em sua feitiçaria.
*********************************
Com uma rosa e uma cigarrilha,
Maria Padilha já chegou,
E na calunga,
Ela é Rainha,
Ela trabalha com muito amor,
Sete cruzeiros da calunga,
É a morada dessa mulher,
Ela é Maria Padilha,
Rainha do Candomblé…
*********************************
Maria Padilha,
Soberana da estrada,
Rainha da encruzilhada,
E também do Candomblé,
Suprema é uma mulher,
de negro,
Alegria do Terreiro,
Seu feitiço tem axé,
Mas ela é, ela é,
Ela é…Rainha da Encruzilhada e mulher de luz e fé.

Muitas são as versões de histórias contadas sobre a vida de Maria Padilha quando encarnada. Vale ressaltar que como são milhares de mulheres que trabalham nessa falange, cada uma traz seu relato de quando era viva. Maria Helena Farelli em sua obra bibliográfica, após diversas pesquisas de campo, divulgou o que poderia ser a história da Líder dessa enorme falange. Eis parte do conteúdo:

Relatos de Maria Padilha:
"Sou branca, não negra, como os Orixás a quem sirvo. Não vim da Nigéria, nasci na Espanha. Não fui rainha, mas usei coroa; por isso ainda uso; é meu direito. Quem me deu a primeira coroa, feita de ouro, esmeraldas, rubis e opalas foi o meu amor, o rei Dom Pedro I de Castela, a quem o povo espanhol chamou 'o Cruel'.
Fui amante do rei de Espanha no tempo em que lá havia mouros e judeus, lá pelos anos de mil trezentos e pouco. Andei em Andaluzia e reinei em Castela, nos fortes e nos palácios; andei em corridas de touros miuras, vi guapos toureiros, grandes espadachins, belos e magros bailarinos de flamenco, e fui muito amada. Não fui a Rainha, ela se chamava Dona Blanca de Borbon, viera da França e era muito sem-graça. Só a mim o rei amou; por mim gemeu e uivou como um cão sem dono num cais da Espanha mourisca. A meus pés ficou como um crente numa capela. Eu fui a dona do dono da terra Andaluza."
Que Dom Pedro apaixonou-se loucamente por ela e que se amolecia todo em seus braços, está dito no próprio romance espanhol:
" El cruel Pedro llamado,
Casou-se com Dona Blanca,
Fuese para Montalván,
Que alli es barraganado,
Com Dona Maria de Padilha,
Que lo tiene enhechizado".

Padilha com a ajuda de feiticeiros e bruxas realizou muitas magias para manter o amor do rei Dom Pedro. E segundo a própria Padilha, suas maiores bruxarias foram feitas em Elche, a cerca de 30 km a sudoeste de Alicante.
Padilha foi certa vez com seus amigos procurar o local onde, segundo a tradição, havia uma estátua, enterrada séculos antes por magos, e que era dada a feitiços fortes: A Dama de Elche. Sua origem é desconhecida; mas as joias que a cobrem não são de origem grega nem romana, nem vem do reino visigodo: elas vieram de Cartago, no norte da África, região com que a antiga população de Elche tinha contato e cujo rei Aníbal, o Conquistador, andou pelo sul da Espanha. A estatueta, um busto de mulher ligeiramente curvado e com uma incisão aberta nas costas, usando grandes argolas nas orelhas, foi um antigo objeto de adoração. Depois de tanto tempo enterrada, chegara a hora de seu feitiço tão antigo ser usado pela amante do rei. Assim contou Padilha:
"Com sete espadas encantadas e um punhal de ouro, fechei meu corpo em Elche. A Dama me olhava. O Céu ficou todo negro. Relâmpagos cruzaram os céus na hora mágica desse rito antigo. Meus sacerdotes de magia negra usavam capuzes. Meu bobo da corte também estava lá, como a vítima sacrificial de um rito pré-histórico; ele trabalhou na magia com sua força, que é
a dos feios, solitários e ridicularizados. Havia ainda um bode negro, com os chifres enfeitados de flores, semelhantes aos belos bodes de Sabá pintados mais tarde por Goya; era o símbolo do Diabo, o portador do mal, ligado aos bobos e aos anômalos; era o centro da cerimônia. Também havia um caduceu, o bastão do poder mágico, o eixo do mundo, com as duas serpentes entrelaçadas e um capacete com pequenas asas no alto. O sacerdote invocou os deuses planetários: Shamash, o deus Sol; Sin, a Lua; Marduk, de Júpiter; Ninib, o Tempo; Nergal, a Guerra. E desde então meu corpo ficou fechado. Voei em um dragão coroado, ígneo, que vence tudo."
Padilha também aprendeu feitiços nos sabás das bruxas. Talvez a mais importante feitiçaria ligada a Padilha seja a que fez com que D. Pedro abandonasse a esposa. Uma lenda andaluza, inscrita em uma fonte de água, conta essa história.
Em resumo, Padilha furtou de uma igreja, um cinto que acreditava ter pertencido a um santo, sendo um objeto de culto. Com a ajuda de um feiticeiro Padilha enfeitiçou o cinto, e sabendo que Dona Blanca, Rainha e esposa de Dom Pedro, havia o presenteado com um cinto de ouro, trocou pelo cinto enfeitiçado. Na noite de núpcias, o rei usando o cinto presenteado, sob a presença de um bispo inquisidor e de um franciscano velho, o cinto se moveu, sibilou e transformou-se em uma cobra, pronta para morder o rei. Em meio a esse fato, Dona Blanca foi abandonada pelo Rei e condenada a morte pela igreja por bruxaria.
As histórias de desamor e matrimônio que uniram uma rainha, um rei e sua amante bruxa, contada pelos trovadores por toda a Ibéria, reforçaram o poder do mito de Padilha. Vindos da Espanha, trazidas pelas canções dos trovadores, a história dessa "mala mujer" penetrou em Portugal e lá fez tradição entre as feiticeiras. Na Lisboa setecentista, as bruxas usavam sortilégios de que Padilha participava em espírito.
Apesar das perseguições, a admiração das rezadeiras pela alma de Padilha só fez crescer. Para ela fizeram seus conjuros e suas invocações fortes. Muitas destas condenadas, foram deportadas para o Brasil, naquela época terra de degredados, de índios não-cristãos, de ciganos e de protestantes em busca de riqueza nesta terra de Arabutã, de pau-brasil, de Vera Cruz, de Santa Cruz; foram viver em Pernambuco, terra para onde eram
mandados os que não eram aceitos na sociedade cristã lisboeta, com batinas por toda parte e com batinas no poder.
Assim, Padilha não veio da África como pomba-gira; não veio com os negros e seus orixás. Ela veio com o colono português e suas lendas, com as portuguesas supersticiosas e seus amores doentios. Veio no meio dos baús de madeira, das velas de sebo de Holanda, junto com bentinhos, escapulários, rosários, lobisomens e mulas-sem-cabeça. Foi no Brasil que ela se misturou com os ritos de origem africana; primeiro nos catimbós do Nordeste, depois nos cultos de Angola, na umbanda e na quimbanda do Rio de Janeiro. Essa combinação das duas tradições explica a sua importância. É por isso que Padilha tornou-se a mais famosa, a rainha, a mulher de Lúcifer.
Sua primeira manifestação na nova terra foi quando "baixou" em um toré. Foi em uma quarta-feira, dia de reunião do toré, que uma mestra balbuciou algo em língua estrangeira e começou a gargalhar. Quem chegara não fora um espírito juremado nem uma mestra Flor; era um espírito desconhecido. Não tinha sangue de índio (sangue "reá"), mas era rainha. Não vinha das aldeias de Laje Grande, Barros de Tauá, Jurema, Pedra Branca ou Urubá, mas sim do estrangeiro. Não quis vela, preferiu cigarro; e pegou firme no médium. Seu nome, disse entre risos: Maria Padilha, e disse que não vinha para ficar, mas estava só de passagem.
De outra vez, ela foi vista na marujada, onde cristãos e mouros guerreavam igualzinho como faziam em sua Castela. E dançou dando risadas tão fortes que a banda parou. Um sacristão se benzeu: aquilo era arte do Tinhoso, era sim... Padilha passou deixando um rastro de perfume que encantou a moçada, fazendo a festa ficar mais quente. Nunca uma marujada teve tantos beijos, chupões, mordidas e promessas de paixão. Até moça fugiu de casa, contam os marujos.
Na noite seguinte, metida em saias engomadas, Padilha "acostou" em uma festa afro-brasileira, o maracatu, um cortejo de influência africana, com estreita ligação com os terreiros nagôs. Ali havia a presença de um rei e de uma rainha, a figura dominante da festa; e disso Padilha entendia bem.
Entrando pela cabeça da Rainha do cortejo, Padilha rebolou a noite toda. Na figura da boneca que vinha na frente do cortejo, reconheceu feitiços de seu tempo na Terra. E riu sua risada diabólica, soltou tanto veneno que o cortejo virou a noite na vadiação. A “Nação Leão Coroado" parou assustado ao ver passar o cortejo onde Padilha bailava solta, nuvem de fumaça da fogueira dos infernos, dama do pé de cabra espanhola, sambando na corte de um antigo rei negro. Os caboclos de lança africanos, segundo consta, brincam atuados, a reconheceram e gritaram em coro:
- Viva Esu, viva a mulher de Esu!
E perguntaram:
- Qual é seu nome, dona da festa?
Ela respondeu:
Sou a rainha Maria Padilha e vim para festejar...
No antigo cortejo nigeriano em louvor a Osum chegara mais uma Legbara, branca, diferente, a mais quente de todas. Estava formando o elo entre a macumba brasileira e o mito ibérico da grande amante feiticeira andaluza.
E Padilha ficou no Nordeste. Já no séc. XVIII, no tempo em que feitiço era coisa muito escondida no Brasil.
Do nordeste, o culto de Padilha foi levado para os terreiros do Rio de Janeiro e Salvador, fazendo assim, seu nome crescer e se perpetuar por toda a Umbanda e Candomblé.