Mostrando postagens com marcador Tiriri. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Tiriri. Mostrar todas as postagens

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2019

Historia Esu Tiriri e Marabo

Tiriri é um dos poucos Esus (entidade) de origem afro. 
Por ser irmão de Marabo a história de um é atrelada a do outro.


















Quanto a princesa assinou a lei que
Acabava com a escravidão
Os grilhões caíram 
O tronco e o chicote foram queimados
Mas tirando isto a vida dos negros 
Não melhorou nada.
Antes eram escravizados
Depois da abolição foram marginalizados. 
Quando o senzala foi fechada
Os antigos senhores enxotaram
Os negros para fora de suas terras
Pois já que a lei dizia que todo
Trabalhador iria ganhar salário
Os senhores preferiram contratar
Os imigrantes italianos
E nisto os negros foram empurrados
Para os morros onde estariam
Longe da vista dos brancos
E nestes mortos nasceram
As favelas. 
Havia um negro liberto 
Que havia sido nomeado Manuel da Silva. 
Mesmo sendo liberto o "Da Silva" 
Que era nome sinônimo de ser escravo
Não foi removido e ele a contra gosto
Teve de continuar assim.
Manuel fora ajuntado a uma outra
Escrava e com ela teve dois filhos 
Mas ela não viveu para ver a liberdade 
Então Manuel criou os dois meninos
Um era corpulento, se chamava Miguel 
Mas todo o povo o nomeava de
Marabô por conta de seu comportamento
Ser similar ao Deus do seus antepassados
E seu irmão mais novo que era também
Forte mas não brutamontes tinha
O nome de Gabriel mas o povo 
O renomeara Tiriri
Pelo mesmo motivo. 
Marabo e Tiriri gostavam
Mais de serem chamados assim
Do que terem que responder pelos
Nomes de anjos que o padre da cidade. havia imposto a eles.
Eles quando eram forçados a ir a Igreja
Viam as imagens de anjos loirinhos
Brancos como leite e de olhos azuis
E não se reconheciam em nada
Mas quando no escuro da noite
Antes de dormir a velha vó negra 
Cochichava para eles as lendas do Orisa Esu
Eles se regozijavam por verem 
Naquele Deus muito mais de si do
Que em todos os anjos do céu. 
Quando cresceram a sociedade esperava
Duas coisas deles
Ou que fossem sapateiros como o pai
Ou que arrumassem algum oficio 
Condizente com a cor de pele que tinham.
Nenhum dos dois quis ser como o pai
E se ajoelhar a vida toda calçando 
Os pés dos brancos malditos
E não viam a menor perspectiva em
Arrumar um trabalho como lavrador
Ou como pedreiro 
Eles queriam mais da vida. 
Foi então que quando ainda eram
Adolescentes os dois arrumaram 
Emprego como leão de chácara 
Em um grande Cabaré, 
A dona era Maria Quitéria
E mesmo sendo branca os tratava muito bem
E eles sabiam que era porque
Ela era tão marginalizada quanto eles
Por ser mulher e por ser prostituta 
Então ela os entendia
E o pagamento que oferecia por deixar
O cabaré em segurança era bom e farto. 
Com os outros leões eles aprenderam 
O manuseio de armas
E na favela onde moravam aprenderam
A capoeira que fazia do corpo deles
Uma arma. 
Quando se tornaram adultos 
Quitéria morreu 
E aquele foi o estopim para que
Buscassem um novo rumo.
Tiriri e Marabo sempre foram
Unha e carne 
Mas houve um fato que os fez se distanciar. 
Este fato se chamava Maria Mulambo.
Mulambo era uma das prostitutas 
Da casa de Quitéria e vivia a fazer
Charme para um e para outro
Dizendo aos dois que se houvesse um
Homem forte e capaz de tirar ela
Daquela vida ela com ele se casaria.
Puxa vida como era bonita! 
E o que tinha de bonita tinha de mentirosa. 
Tiriri caiu e começou a dar a ela
Dinheiro pois ela dizia que devia
Ao cabaré e que só poderia sair de lá
Quando saudasse a divida. 
Marabo também caiu nessa
E mais muitos caíram nas lorotas dela.
Quanto Marabo descobriu que Tiriri
Também era amante de Mulambo
Os irmãos brigaram e chegaram as 
Vias de fato.
A grande amizade dos dois esmoreceu
E eles decidiram se separar. 
Marabo quis ficar 
Ainda tinha esperança de casar com 
Mulambo.
Ele Não era mais leão de chácara
Mas sim um jagunço contratado
Um tipo de mercenário.
Tiriri arrumou a trouxa, jogou nas costas
E caçou seu rumo para o norte.
Mulambo, safada como era 
Quando estava com muitos sacos
Cheios de ouro 
Saiu do cabaré
Mas não para deixar de ser da vida, 
Com o dinheiro comprou um cabaré para si
E de prostituta virou foi cafetina.
Marabo se desgostou tanto 
Que se jogou em todo tipo de negócio escuso.
Tiriri no norte vivia de pequenos serviços e golpes
Não era boa gente, era perigoso
E quanto mais os anos passavam
Mais rico ele ficava
E mais sujas de sangue suas mãos eram.
Tiriri se associou a uma trupe perigosa
Que hoje em dia seria até chamada gangue
Mas na época era so um grupo de meliantes.
Haviam muitos grupos pelo país
Cada um em uma área e nenhum
Passava os limites.
Tiriri se tornou chefe deste grupo
E por muitas vezes matou homens
Do Sul que invadiam o território 
Que a ele pertencia.
Não foram um, não foram dois
Foram mais de uma dezena de sulistas
Passados no fogo e na faca
Pois o próprio Tiriri dizia que 
Cada lobo fora de sua alcateia é presa.
Certa vez ele foi ao sul ver o irmão
Mas toda a história se repetiu
Desta vez uma outra mulher, Sete Saias
Esteve entre os dois
E no fim a visita de conciliação
Acabou com ambos saindo aos murros
E os companheiros de Tiriri que eram
Do Norte acabaram por fazer
Um banho de sangue matando
Os sulistas na própria área deles.
Não dava mais
Não era mais amigos
Marabo e Tiriri não podiam mais conviver. 
Os anos corriam como água no rio
E então Tiriri recebeu uma carta
De Marabo.
Muito surpreso do irmão estar
Escrevendo para ele achou que
A mensagem seria de paz 
Mas não, a mensagem era de tristeza.
Manuel, o pai dos ambos estavam no
Leito de morte e pedia para ver
Os dois juntos uma última vez.
Tiriri arrumou a mala e correu para o 
Porto afim de descer a costa de navio.
Os companheiros do grupo avisaram
A ele para não ir
Pois no sul havia um outro grupo
De meliantes que o iriam reconhecer
E se tivessem oportunidade o iriam matar.
Os companheiros pediram que ele
Pelo menos informasse as gangues do Sul
Pois no sul haviam tanto um coronel
Muito mal encarado chamado de Tranca Ruas
Quanto um bandido cruel chamado Zé Pelintra
E era ideal que ele informasse
Que estava indo lá em paz
Mas Tiriri voou como um alucinado
Deixando Recife para trás
Ele só queria ver o pai.
Quando aportou em Santos
Todos os Malandros o fitaram
E os informantes do coronel também
Não deixaram de notar. 
Tiriri comprou um cavalo e correu um dia e uma noite 
Para a casa do pai
Quando chegou lá 
Marabo que era um brutamontes de tão
Forte e musculoso estava na sentado
Ao chão e segurava uma das mãos do velho deitado a cama. 
Tiriri sem dizer nada apenas se sentou
No chão do outro lado
E tomou a outra mão do pai.
Os irmãos ficaram ali com Manuel
E o velho pedia para que os dois ficassem juntos
Pois só tinham um ao outro no mundo.
Pedia que se casassem, que formassem
Família e que vivessem em paz.
Os três ficaram juntos e imóveis
Até que algumas que horas depois
A vida abandonou o velho homem. 
Tiriri se levantou afim de ir chamar
Uma anciã da favela para fazer
Os ritos fúnebres no pai
Mas quando abriu a porta
Deu de cara com um mar de homens
De terno branco
E no meio deles aquele negro alto 
Com dentes de ouro e sorriso escarnecedor, Zé Pelintra. 
Tiriri falou que estava ali só pelo pai
E que não queria confusão
Mas Zé lembrou que na última visita
Que Tiriri fez 
O sangue de muitos sulistas correu na rua
O inferno reuniu no Su
Pelas mãos dos meliantes do norte.
Tiriri tentou argumentar quando 
Ali no batente da porta da casa da pai
O primeiro tiro foi disparado
Seguido por tantos que nem dava para
Contar quantos. 
O corpo de Tiriri apenas estremecia
Enquanto as balas atravessavam a carne.
Quando Marabo correu de dentro da casa para
Ajudar o irmão já era tarde
Tiriri caiu morto. 
Marabo quando saia do sério
Agia como louco
E perder o pai e o irmão no mesmo dia
O deixou totalmente fora de si.
Ele passou a mão na faca que trazia
Na cintura e se jogou no meio
Do exército de malandros de Zé Pelintra.
Zé tentou intervir dizendo aos malandros
Para não ferirem Marabo
Pois ele não era inimigo
Mas Marabo começou a derrubar um a um
Cortando as gargantas dos homens de terno branco
Então Zé Pelintra não teve como
Conter as pistolas deles
E uma saraivada de tiros
Foi lançada sobre Marabo.
Mas Marabo não caiu,
O povo atirava mas ele continuava e
Quando mais da metade dos malandros ja havia sido passado na faca
Zé Pelintra entendeu o que acontecia,
Marabo tinha o corpo fechado. 
Isso era feitiçaria africana antiga
Dada aos filhos de Ogun
E feita pelas velhas mães de Santo
Que tinham o sangue antigo nas veias.
Nenhuma bala ou lâmina comum
Mataria um homem de corpo fechado.
Então Zé que era entendido 
Correu a pegar uma lâmina benzida nas mesmas sete ervas que eram
Usadas para fechar o corpo
E com a lâmina na mãos ele caiu sobre Marabo
Cravando o ferro no peito do gigante.
Marabo finalmente caiu.
A confusão acabou ali, Zé Pelintra
Se foi levando consigo os corpos dos mortos de sua trupe
E o povo da Favela foi chamar 
Maria Mulambo para contar do ocorrido.
Maria Mulambo era quem realmente mandava ali.
Quando Mulambo chegou 
Tranca ruas ja estava lá
E ele como homem da lei iria
Jogar o corpo dos três em uma vala comum e enterrar como indigentes
Mas Mulambo o convenceu a deixar
Ela tomar conta disso.
Ela deu um lugar de descanso 
Para os corpos de Manuel
Marabo e Tiriri
Pagou para que fossem valados
Com dignidade. 
O corpo dos três foi enterrado
No alto do morro onde ninguém
Os perturbaria.
Os dois irmãos valentes até hoje
Existem
Mas agora são espíritos
Porém mesmo mortos ainda são cheios de valentia.

Saravá Tiriri!


Arte&Texto:
Felipe Caprini