domingo, 4 de agosto de 2019

Lendas Africanas - Obá

OBA, a terceira mulher de Xangô

Obá era uma mulher cheia de vigor e coragem.
Faltava-lhe, talvez, um pouco de charme e refinamento.
Mas ela não temia ninguém no mundo.
Seu maior prazer era lutar.
Seu vigor era tal que ela escolheu a luta e o pugilato como profissão.
Obá venceu todas as disputas que foram organizadas entre ela e diversos orixás. Ela derrubou
Obatalá, tirou Oxóssi de combate e deixou no chão Orunmilá.
Oxumaré não resistiu à sua força.
Ela desafiou Obaluaê e botou Exu pra correr.
Chegou a vez de Ogum!
Ogum teve o cuidado de consultar Ifá, antes da luta.
Os adivinhos lhe disseram para fazer oferendas, compostas de duzentas espigas de milho e
muitos quiabos.
Tudo pisado num pilão para se obter uma massa viscosa e escorregadia.
Esta substância deveria ser depositada num canto do terreno onde eles lutariam. Ogum seguiu
fielmente estas instruções.
Na hora da luta, Obá chegou dizendo:
"O dia do encontro é chegado." Ogum confirmou:
"Nós lutaremos, então, um contra o outro."
A luta começou.
No início, Obá parecia dominar a situação.
Ogum recuou em direção ao lugar onde ele derramara a oferenda.
Obá pisou na pasta viscosa e escorregou.
Ogum aproveitou para derrubá-Ia.
Rapidamente, libertou-se do pano que vestia e a possuiu ali mesmo, tomando-se, desta
maneira, seu primeiro marido.
Mais tarde, Obá tomou-se a terceira mulher de Xangô, pois ela era forte e corajosa. A
primeira mulher de Xangô foi Oiá-Iansã, que era bela e fascinante.
A segunda foi Oxum, que era coquete e vaidosa.

Uma rivalidade logo se estabeleceu entre Obá e Oxum.
Ambas disputavam a preferência do amor de Xangô.
Obá sempre procurava surpreender o segredo das receitas utilizadas por Oxum quando esta
preparava as refeições de Xangô.
Oxum irritada, decidiu preparar-lhe uma armadilha.
Convidou Obá a vir, um dia de manhã, assistir à preparação de um prato que, segundo ela,
agradava infinitamente a Xangô.
Obá chegou na hora combinada e encontrou Oxum com um lenço amarrado à cabeça,
escondendo as orelhas.
Ela preparava uma sopa para Xangô
onde dois cogumelos flutuavam na superfície do caldo.
Oxum convenceu Obá que se tratava de suas orelhas,
que ela cozinhava, desta forma,
para preparar o prato favorito de Xangô.
Este logo chegou, vaidoso e altivo.
Engoliu, ruidosamente e com deleite, a sopa de cogumelos e galante e apressado, retirou-se
com Oxum para o quarto.
Na semana seguinte, foi a vez de Obá cuidar de Xangô.
Ela decidiu pôr em prática a receita maravilhosa.
Xangô não sentiu nenhum prazer ao ver que Obá se cortara uma das orelhas.
Ele achou repugnante o prato que ela lhe preparara.
Neste momento, Oxum chegou e retirou o lenço,
mostrando à sua rival que suas orelhas não haviam sido cortadas, nem comidas. Furiosa, Obá
precipitou-se sobre Oxum com impetuosidade.
Uma verdadeira luta se seguiu.
Enraivecido, Xangô trovejou sua fúria.
Oxum e Obá, apavoradas, fugiram e transformaram-se em rios.
Até hoje, as águas destes rios são tumultuadas e agitadas no lugar de sua confluência, em
lembrança da briga que opôs Oxum e Obá pelo amor de Xangô.



Lendas retiradas do livro: LENDAS AFRICANAS DOS ORIXAS de PIERRE FATUMBI VERGER

Lendas Africanas - Oxun

Orê Yeyê ô!

Oxum era muito bonita, dengosa e vaidosa. Como o são, geralmente, as belas mulheres.
Ela gostava de panos vistosos, marrafas de tartaruga e tinha, sobretudo, uma grande paixão
pelas jóias de cobre. Antigamente, este metal era muito precioso na terra dos iorubas. Só uma
mulher elegante possuía jóias de cobre pesadas.
Oxum era cliente dos comerciantes de cobre.
Omiro wanran wanran wanran omi ro!
"A água corre fazendo o ruído dos braceletes de Oxum!"
Oxum lavava suas jóias antes mesmo de lavar suas crianças. Mas tem, entretanto, a reputação
de ser uma boa mãe e atende as súplicas das mulheres que desejam ter filhos.
Oxum foi a segunda mulher de Xangô.
A primeira chamava-se Oiá-Iansã e a terceira Obá.
Oxum tem o humor caprichoso e mutável.
Alguns dias, suas águas correm aprazíveis e calmas, elas deslizam com graça, frescas e
límpidas, entre margens cobertas de brilhante vegetação.
Numerosos vãos permitem atravessar de um lado a outro.

Outras vezes, suas águas tumultuadas passam estrondando, cheias de correntezas e torvelinhos,
transbordando e inundando campos e florestas.
Ninguém pode atravessar de uma margem para a outra, pois nenhuma ponte faz a ligação.
Oxum não toleraria uma tal ousadia!
Quando ela está em fúria, ela leva para longe e destrói as canoas que tentam atravessar o rio.
Olowu, o rei de Owu, ia para a guerra seguido de seu exército. Por infelicidade, tinha que
atravessar o rio num dia em que este estava enfurecido.
Olowu fez a Oxum uma promessa solene, entretanto, mal formulada. Ele declarou:
"Se você baixar o nível de suas águas,
para que eu possa atravessar e seguir para a guerra, e se
eu voltar vencedor,
prometo a você nkan rere", isto é, boas coisas.
Oxum compreendeu que ele falava de sua mulher, Nkan, filha do rei de Ibadan. Ela baixou o
nível das águas e Olowu continuou sua expedição.
Quando ele voltou, algum tempo depois,
vitorioso e com um espólio considerável, novamente encontrou Oxum com o humor
perturbado.
O rio estava turbulento e com suas águas agitadas.
Olowu mandou jogar sobre as vagas toda sorte de boas coisas, as
nkan rere prometidas:
tecidos, búzios, bois, galinhas e escravos;
mel de abelhas e pratos de mulukun, iguaria onde misturam-se suavemente cebola, feijão
fradinho, sal e camarões.
Mas Oxum devolveu todas estas coisas boas sobre as margens.
Era Nkan, a mulher de Olowu, que ela exigia.
Olowu foi obrigado a submeter-se e jogar a sua mulher nas águas.
Nkan estava grávida e a criança nasceu no fundo do rio.
Oxum, escrupulosamente, devolveu o recém-nascido dizendo:
"É Nkan que me foi solenemente prometida e não a criança. Tome-a!"
As águas baixaram e Olowu voltou tristemente para sua terra.
O rei de Ibadan, sabendo do fim trágico de sua filha, declarou indignado: "Não foi para que
ela servisse de oferenda a um rio que eu a dei em casamento a Olowu!"
Ele guerreou com o genro e o expulsou do país.
O rio Oxum passa em um lugar onde suas águas são sempre abundantes. Por esta razão é que
Larô, o primeiro rei deste lugar, aí instalou-se e fez um pacto de aliança com Oxum.
Na época em que chegou, uma das suas filhas fora banhar-se.
O rio a engoliu sob as águas.
Ela só saiu no dia seguinte, soberbamente vestida, e declarou que Oxum a havia bem acolhido
no fundo do rio.
Larô, para mostrar sua gratidão, veio trazer-lhe oferendas.
Numerosos peixes, mensageiros da divindade, vieram comer, em sinal de aceitação, os
alimentos jogados nas águas.
Um grande peixe chegou nadando nas proximidades do lugar onde estava Larô. O peixe cuspiu
água, que Larô recolheu numa cabaça e bebeu, fazendo, assim, um pacto com o rio.
Em seguida, ele estendeu suas mãos sobre a água e o grande peixe saltou sobre ela.
Isto é dito em ioruba: Atewo gba ejá.
O que deu origem a Ataojá, título dos reis do lugar.
Ataojá declarou, então:
Oxum bgô!
"Oxum está em estado de maturidade, suas águas são abundantes."
Dando origem ao nome da cidade de Oxogbô.
Todos os anos faz-se, aí, grandes festas em comemoração a todos estes acontecimentos.



Lendas retiradas do livro: LENDAS AFRICANAS DOS ORIXAS de PIERRE FATUMBI VERGER

Lendas Africanas - Oya - Iansã

Eparrey!

Ogum foi um dia caçar na floresta.
Ele ficou na espreita e viu um búfalo vindo em sua direção.
Ogum avaliou logo a distância que os separava e preparou-se para matar o animal com a sua
espada.
Mas viu o búfalo parar e, de repente, baixar a cabeça e despir-se de sua pele.
Desta pele saiu uma linda mulher.
Era Iansã, vestida com elegância, coberta de belos panos, um turbante luxuoso amarrado à
cabeça e ornada de colares e braceletes.
Iansã enrolou sua pele e seus chifres,
fez uma trouxa e escondeu num formigueiro.
Partiu, em seguida, num passo leve, em direção ao mercado da cidade, sem desconfiar que
Ogum tinha visto tudo.
Assim que Iansã partiu, Ogum apoderou-se da trouxa, foi para casa, guardou-a no celeiro de
milho e seguiu, também, para o mercado.
Lá, ele encontrou a bela mulher e cortejou-a.
Iansã era bela, muito bela, era a mais bela mulher do mundo.
Sua beleza era tal que se um homem a visse, logo a desejaria.
Ogum foi subjugado e pediu-a em casamento.
Iansã apenas sorriu e recusou sem apelo.
Ogum insistiu e disse-lhe que a esperaria.
Ele não duvidava de que ela aceitasse sua proposta.
Iansã voltou à floresta e não encontrou seu chifre nem sua pele.
"Ah! Que contrariedade! Que teria se passado? Que fazer?"
Iansã voltou ao mercado, já vazio, e viu Ogum que a esperava.
Ela perguntou-lhe o que ele havia feito daquilo que ela deixara no formigueiro. Ogum fingiu
inocência e declarou que nada tinha a ver, nem com o formigueiro nem com o que estava nele.
Iansã não se deixou enganar e disse-lhe:
"Eu sei que você escondeu minha pele e meu chifre.
Eu sei que você se negará a me revelar o esconderijo.
Ogum, vou me casar com você e viver em sua casa.
Mas, existem certas regras de conduta para comigo.
Estas regras devem ser-sespeitadas, também, pelas pessoas da sua casa. Ninguém poderá me
dizer: Você é um animal!
Ninguém poderá utilizar cascas de dendê para fazer fogo.
Ninguém poderá rolar um pilão pelo chão da casa".

Ogum respondeu que havia compreendido e levou Iansã.
Chegando em casa, Ogum reuniu suas outras mulheres e explicou-lhes como deveriam
comportar-se.
Ficara claro para todos que ninguém deveria discutir com Iansã, nem insultá-Ia.
A vida organizou-se.
Ogum saía para caçar ou cultivar o campo.
Iansã, em vão, procurava sua pele e seus chifres.
Ela deu à luz uma criança, depois uma segunda e uma terceira ... Ela deu à luz nove crianças.
Mas as mulheres viviam enciumadas da beleza de Iansã.
Cada vez mais enciumadas e hostis,
elas decidiram desvendar o mistério da origem de Iansã.
Uma delas conseguiu embriagar Ogum com vinho de palma.
Ogum não pôde mais controlar suas palavras e revelou o segredo. Contou que Iansã era, na
realidade, um animal; que sua pele e seus chifres estavam escondidos no celeiro de milho.
Ogum recomendou-lhes ainda:
"Sobretudo não procurem vê-los, pois isto a amedrontará.
Não lhes digam jamais que é um animal!"
Depois disso, logo que Ogum saía para o campo, as mulheres insultavam Iansã:
"Você é um animal! Você é um animal!!"
Elas cantavam enquanto faziam os trabalhos da casa:
"Coma e beba, pode exibir-se, mas sua pele está no celeiro de milho!"
Um dia, todas as mulheres saíram para o mercado.
Iansã aproveitou-se e correu para o celeiro.
Abriu a porta e, bem no fundo, sob grandes espigas de milho, encontrou sua pele e seus
chifres.
Ela os vestiu novamente e se sacudiu com energia.
Cada parte do seu corpo retomou exatamente seu lugar dentro da pele.
Logo que as mulheres chegaram do mercado, ela saiu bufando.
Foi um tremendo massacre, pelo qual passaram todas.
Com grandes chifradas Iansã rasgou-lhes a barriga, pisou sobre os corpos e redou-os no ar.
Iansã poupou seus filhos que a seguiam chorando e dizendo:
"Nossa mãe, nossa mãe! É você mesma?
Nossa mãe, nossa mãe!! Que você vai fazer?
Nossa mãe, nossa mãe! !! Que será de nós?"
O búfalo os consolou, roçando seu corpo carinhosamente no deles e dizendo-lhes: "Eu vou
voltar para a floresta; lá não é um bom lugar para vocês.
Mas, vou lhes deixar uma lembrança."
Retirou seus chifres, entregou-lhes e continuou:
"Quando qualquer perigo lhes ameaçar, quando vocês precisarem dos meus conselhos,
esfreguem estes chifres um no outro.
Em qualquer lugar que vocês estiverem, em qualquer lugar que eu estiver, escutarei suas
queixas e virei socorrê-los."
Eis porque dois chifres de búfalo estão sempre no altar de Iansã.



Lendas retiradas do livro: LENDAS AFRICANAS DOS ORIXAS de PIERRE FATUMBI VERGER